Empreendedorismo e Inovação Mercado

O que é a logística: Artigo 2 – As Angústias da Gestão de Estoque

O estoque pode ser a solução para garantir “Alto Nível de Serviço Logístico”. Mas quanto custa isso?

No Artigo 1 da série “O que é Logística”, foi discutida a importância da Disponibilidade ou “Alto Nível de Serviço Logístico”. Segundo a abordagem, o consumo vem se expandindo com taxas elevadas em regiões tradicionalmente de baixa renda. A partir de 1994, no Brasil, famílias que anteriormente não tinham acesso a produtos ou serviços passaram a consumir cada vez mais na busca pela satisfação de seus sonhos até então não atendidos. Com a renda limitada, ocasionada por um mercado com baixo crescimento econômico e elevadas taxas de inflação, revertidas com a criação do Plano Real, essas pessoas puderam ver boa parte de sua demanda reprimida ser satisfeita.

A Mobilidade Social gerada pela estabilização e amadurecimento da economia, crescimento econômico e bônus demográfico vem favorecendo a ascensão de famílias a novos níveis de renda, permitindo a elas comprar todos os tipos de produtos, desde eletrônicos, carros, móveis e até imóveis, além de usufruir de serviços como próteses e implantes dentários, viagens internacionais e planos de saúde antes direcionados às pessoas com renda alta.

A diferença entre estes novos consumidores e os tradicionais, os pertencentes às classes A e B, é que a nova classe média, que são as famílias provenientes da classe C, iniciou recentemente o processo de consumo, portanto muitos estão consumindo, pela primeira vez, computadores, celulares ou televisores de alta definição, algo que os mais abastados já possuem há algum tempo. Logo, quando alguém pertencente a classes sociais do topo da pirâmide (e por isso experiente no consumo de determinada categoria de produto ou serviço) pretende trocar um produto por outro de uma nova geração, certamente será mais tolerante à espera, pois a experiência do consumo, para ele, não é nova. Diante disso, pode-se dizer que a tolerância está associada ao fato de que, possuindo um produto de uma geração anterior, a ansiedade para usufruir o novo bem é menor. No caminho inverso estão os novos consumidores. Estes têm pressa, pois desejam compensar o tempo perdido não suportando, portanto, a espera.

O sentimento do consumo imediato associado ao ciclo de vida cada vez menor dos produtos e serviços, que traz a sensação de que se o bem desejado não for adquirido instantaneamente o mesmo estará obsoleto, leva o consumidor a um comportamento de compra focado em adquirir o produto na “primeira tentativa de compra”. Essa situação pode ser traduzida da seguinte maneira: se o novo consumidor não encontrar o produto ou serviço pretendido, ele escolherá outro bem da marca concorrente que possa substituir o desejado ou então poderá ainda trocá-lo por outra categoria de produto. A ida a um ponto de vendas com o intuito de comprar torna-se quase que uma obrigação para este novo consumidor, que tem como meta retornar à sua residência com um “troféu” com o qual ele se condecorou pelo seu árduo trabalho.

A ansiedade de consumo, por parte deste novo consumidor, faz com que a não presença de determinado produto em um ponto de vendas gere perdas de receitas definitivas, visto que o cliente irá substituí-lo por um outro da marca concorrente ou  comprometerá sua renda com um produto de outro segmento.

Garantir níveis de serviço logístico elevados passa a ser um diferencial competitivo, pois com eles pode-se atender a expectativa do mercado para o qual foram direcionados. O “alto nível de serviço” pode ser, inclusive, uma barreira de entrada para novos player, pois ao atender as três premissas discutidas no Artigo 1 para maximizar a decisão de compras pelo cliente –  Alto Nível de serviço (I), Share of Mind (II) e Preço (III) – obtém-se a preferência contínua por parte do mercado atendido.

Pode-se perceber a relação entre o “alto nível de serviço” e a perda de vendas na Figura 1, a seguir:

 

Da premissa obtida na Figura 1, onde a perda de vendas tende a diminuir enquanto aumenta a disponibilidade, podemos notar a importância de manter um inventário com o objetivo de garantir o “Serviço de Logística de Alto Nível”. No entanto, é necessário garantir, para o armazém realiza a sua função, o armazenamento do produto de acordo com as expectativas do cliente, caso contrário ele vai significar perdas financeiras.

Outro ponto a ser analisado é o estágio do ciclo de vida onde o produto é. Com a possibilidade de obsolescência de um produto, seu ciclo de vida deve ser considerada como um fator de risco na decisão de estocá-lo, porque haverá perda financeira se for ultrapassado um certo estágio. O ciclo de vida de um produto é dividido em quatro fases: introdução no mercado, crescimento, maturidade e saturação e declínio, como pode ser visto na Figura 2:

 Este modelo de ciclo de vida tende a ocorrer com todos os produtos ou serviços que possuem alguma propensão a sofrer modificações tecnológicas, alterando sua configuração, especificação ou mesmo o design. Estas modificações se inclinam em direção ao despertar do desejo pelo novo, independente de qual classe social o consumidor pertença.

De acordo com o intervalo do ciclo de vida em que se encontra um produto ou serviço, a ansiedade por parte do cliente em adquiri-lo imediatamente tende a aumentar, pois haverá maior percepção da obsolescência. Outro ponto a ser avaliado é que há uma relação entre o ciclo de vida e a classe social para o qual o mesmo será vendido, ou seja, quando uma nova categoria de um produto é lançada, ela mesma tende a atender as classes do topo da pirâmide e, ao longo do tempo, ela vai se aproximando da base. Esta correlação pode ser mostrada na Figura 3:

 

 De acordo com a Figura 3, pode-se perceber a relação entre Ciclo de Vida X Quantidade Demandada X Preço X Ciclo de Vida. Com a movimentação do produto na curva do ciclo de vida, ou seja, quanto mais o produto envelhece, mais ele será demandado. O aumento de demanda tende a fazer com que o preço caia, pois há um aumento na escala produtiva, reduzindo assim o seu custo e, consequentemente, abaixando o preço para o consumidor. Com isso, haverá mais acesso aos produtos pelas classes mais baixas, proporcionando a aceleração da quantidade demandada aumentando a escala industrial, reduzindo ainda mais o preço. Este processo irá se encerrar no momento em que a demanda estiver satisfeita e/ou na introdução de um produto substituto contendo mais inovações tornando o anterior obsoleto.

A gestão de estoque precisa é fundamental, pois quando o produto não está disponível ocorrerão perdas de vendas e, consequentemente, perdas na receita. Porém se houver produtos armazenados e os mesmos estiverem obsoletos também haverá perdas financeiras relativa à depreciação do ativo. Entenda-se depreciação como os custos ou as despesas decorrentes do desgaste ou da obsolescência dos ativos imobilizados.

Um último problema em relação à manutenção de estoques se refere ao Custo de Oportunidade. Quando os produtos ainda estão nas fases iniciais do ciclo de vida e seu giro é lento, ou seja, suas vendas estão abaixo da projeção inicial, o capital imobilizado nos estoques pode estar sujeito ao custo de oportunidade que ocorre quando se renunciao investimento em detrimento de outro. Os benefícios que poderiam ser obtidos a partir desta oportunidade renunciada, quando superiores aos da escolha realizada, geram perdas de capital que será o custo de oportunidade. Em outras palavras, o custo de oportunidade representa o valor associado à melhor alternativa não escolhida.

Conclui-se, então, que o estoque, quando não gerido com precisão, poderá ocasionar perdas financeiras elevadas, eliminando a vantagem competitiva de manter “Alto Nível de Serviço Logístico”. Portanto, o estoque poderá ser estratégico quando dimensionado com precisão, ou seja, adequando-se aos volumes demandados, na frequência do giro de produtos projetado e em sincronia com o ciclo de vida do mesmo.

Usar todos os atributos disponíveis na logística para garantir vantagem competitiva é fundamental para conquistar o mercado, porém, para isso, é necessário compreender o que é a logística.

No próximo artigo será abordada a importância da visão holística para gestão da cadeia de suprimentos.

Fernando Arbache

Fernando Arbache

Mestre em Engenharia Industrial PUC/Rio. Independent Education Consultant working with MIT Professional Education. Graduado em Engenharia Civil, UFJF. Data and Models in Engineering, Science, and Business/MIT, Cambridge, MA (USA). Challenges of Leadership in Teams/MIT, Cambridge, MA (USA). Data Science: Data to Insights/MIT, Cambridge, MA (USA). AnyLogic Advanced Program of Simulation Modeling/Hampton, NJ (USA). Experiência Acadêmica: Educational Consultant working with MIT. Instructor in Digital Courses at MIT Professional Education in Digital Transformation and Leadership in Innovation. Atuou cimo coordenador da FGV em cursos de Gestão. Atuou como professor FGV, nas cadeiras e Logística, Estatística, Gestão de Riscos e Sistemas de Informação. Professor da HSM Educação, IBMEC e FATEC. Livros escritos: ARBACHE, F. Gestão da Logística, Distribuição e Trade Marketing. São Paulo: Ed. FGV, 2004. ARBACHE, F. Logística Empresarial. Rio de Janeiro: Ed. Petrobras, 2005. ARBACHE, A. P. e ARBACHE, F. Sustentabilidade Empresarial no Brasil: Cenários e Projetos. São José do Rio Preto- SP: Raízes Gráfica e Editora, 2012. Pesquisa: Desenvolvimento de modelos de mapeamento de Competências Comportamentais e Técnicas, por meio de gamificação com uso de Inteligência Artificial, utilizando Deep Learning e Machine Learning (http://www.arbache.com/mobi). Programa de Inovação com 75 cooperativas de diversas áreas de atuação e aproximadamente 500 participantes, com Kick-off no MIT PE (http://www.arbache.com/inovacoop). Desenvolvimento de Inteligências nos dados e métricas - Big data e precisão nas tomadas de decisões na gestão de pessoas. Experiência Profissional: CIO (Chief Innovations Officer) da empresa Arbache Innovations especializada em simulação, inovação com foro em HRTech e EduTech – empresa premiada no programa Conecta (http://conecta.cnt.org.br) como uma das 5 entre 500 startups mais inovadoras da América Latina. Acelerada pela Plug&Play (https://www.plugandplaytechcenter.com) em Sunnyvale, CA – Vale do Silício entre novembro e dezembro de 2018. Desenvolvimento de parceria com o MIT – Massachusetts Institute of Technology para cursos presenciais e digitais – http://www.arbache.com/mitpe, https://professional.mit.edu/programs/digital-plus-programs/who-we-work & https://professional.mit.edu/programs/international-programs/who-we-work

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