Empreendedorismo e Inovação Gestão de Projetos

Black Fraude

Por – Mathias Carvalho

BLACK FRAUDE – o enorme impacto do fator colaborativo na web em projetos promocionais “diferenciados”. Como engajar os stakeholders certos da maneira mais errada possível.

Este tema foi gerado como uma inspiração de último minuto. Desde já, peço desculpas aos meus leitores, porém acredito que muitos se identificarão, de maneira pessoal, com meu relato e, de maneira profissional, com o contexto que tem em relação á gestão de stakeholders em projetos.

Na data em que escrevo este texto, já tive duas experiências muito desagradáveis durante uma data que, na sua segunda edição, se consolidou como o “dia do pega-trouxa”.  Trata-se da imitação barata de um evento colaborativo de muito sucesso nos estados unidos, onde o ambiente e o grau de maturidade (e, convenhamos, maturidade) é bem maior, sendo que o de oportunismo é notoriamente menos pronunciado. Para quem ainda não descobriu do que se trata, é a chamada “Black Friday” (de negra, esta sexta-feira afeta mais o mau humor dos consumidores que, como eu, se sentem lesados e insultados). Mas, para continuar escrevendo, preciso ser objetivo e deixar esta minha raiva de lado. Tentar, eu bem que vou, você leitor poderá avaliar se tive sucesso. Continue lendo e veremos.

Pois é, eu recebi (como muitos de vocês) inúmeras mensagens não – solicitadas em minha caixa postal, prática tão corriqueira que SPAM agora é um fato da vida – o que não pode ser mudado, deve ser suportado. A diferença desta semana “spamada” das outras, é que o tema estava coberto de promessas obscuras. Por questão do destino, duas apenas me interessavam: faz muito tempo que desejo comprar um tablete, e tenho dois ou três modelos em mente. Só estou esperando uma boa oportunidade. A outra é que preciso comprar uma passagem para Buenos Aires, no primeiro trimestre, e estava procurando saber de promoções.

Pois bem, uma conhecida empresa aérea brasileira lançou, na semana inteira, uma campanha promocional online clamando que, na fatídica sexta-feira, haveriam promoções com grandes descontos. Dito e feito, hoje recebi um email da empresa que fornecia um link para passagens até o dia 30 de maio de 2014, com descontos de 50%. Não é apenas uma porcentagem anunciada, mas sim um valor final que corresponde à este abate no preço normal.

Como a internet ficou “intransitável” logo cedo de manhã, e o site da empresa já não suportava acessos (estrutura muito subdimensionada para estes picos de acesso), não perdi tempo e foi até a loja física mais próxima, munido de meu cartão de crédito e de disposição para fechar negócio. Mas com a eterna pulga atrás da orelha, esta criada desde a primeira e falida versão deste evento, extremamente criticado em 2012 (aliás, esta mesma empresa sofreu críticas pesadas pelos mesmos motivos – certas coisas nunca mudam).

Como eu esperava, o pobre coitado atrás da mesa bem que procurou, mas no mês de maio do ano que vêm (data limite anunciada), NENHUM vôo estava associado à promoção da Black Friday Não se trata de poucas opções, horários impraticáveis, condições nas entrelinhas, etc. Simplesmente, o mês inteiro ficou de fora, sem dissimulações. Perdi meu tempo, minha (pouca paciência) e fiquei, literalmente, a ver navios (mas sem avião). Tive que fechar com outra empresa, mas a preços de ouro, como se praticam no Brasil. Depois de tanto “hype”, mais esta  Black Friday se perdeu na “noite dos tempos”, não fez nem sombra.

Já que estava no shopping, resolvi procurar, em outra conhecida loja de varejo a qual não citarei o nome, por promoções deste tipo. Havia, sim, etiquetas negras espalhadas por diversos produtos. Foi até a seção de tablets, para averiguar as ofertas. Constatei dois pontos: os produtos em promoção estavam quase todos saindo de linha ou eram os “micos de vendas”. E, apesar das etiquetas anunciarem “80% de desconto”, em letras garrafais, quando eu usei os óculos, notei um micro sinal de “mais” ao lado. Calculando os descontos, o melhor não passava de 20%. Ou seja, igual a qualquer promoção corriqueira da loja.

O catalizador digital

Esta longuíssima história tem uma relevância sobre a gestão de projetos promocionais na web. As costumeiras práticas “deslavadas” de ofertas disfarçadas, a que estamos tão acostumados a ver, em pontos de venda físicos, enfrentam hoje um novo perfil de consumidor, a principal parte interessada que influi no resultado de qualquer campanha. Ele é uma pessoa que investiga, reclama e – o pior, “NÃO” compra, a não ser que precise mesmo. Este tipo de campanha com prazo marcado (o bom e velho “só até sábado”), geralmente tem dois objetivos: levar o consumidor à loja (física e virtual), fazendo o estoque girar – além de promover a marca, peca ao tentar tirar vantagem da suposta ignorância do consumidor. Mas nenhum deles será atingido, dada a disposição e da desconfiança dos consumidores, estes munidos de duas poderosas ferramentas: a informação (na ponta, literalmente, dos dedos) e a colaboração (ao dar notas e comentar sobre tudo e todos). O mundo da oferta fácil acabou no dia em que um consumidor publicou uma resenha de venda de produto, e todo mundo leu.

No caso da empresa aérea, enquanto eu espumava de raiva na loja física, constatei que já haviam inúmeras reclamações no site Reclame Aqui (www.reclameaqui.com.br) sobre este evento, dos consumidores frustrados com a inadequação do site de vendas da empresa, alguns citando até que – mesmo entrando no sistema, não encontravam os valores anunciados. No caso da loja de eletrônicos, o tradicional esquema da “etiqueta de promoção” estava sendo divulgada pelos usuários de dispositivos móveis como “aquém do esperado”.

O resultado prático de todo um esforço realizado pelas empresas que realizam promoções “sem pé nem cabeça”, além do gasto de tempo e recursos, é um belo tiro na cabeça da imagem de marca. Isso somado á péssima repercussão que mais uma destas “Black Friday” terá, pelo andar da carruagem de hoje.

Além das intenções – no mínimo questionáveis – dos planejadores de tais iniciativas, algumas até passíveis de recursos junto ao PROCON, como constatamos em 2012, a completa e total inadequação quanto a uma análise de stakeholders parece ser patente. Prefiro especular que nenhuma análise foi realizada, por o efeito será provavelmente tão negativo – no tocante á imagem das empresas participantes assim como do evento em geral – que, se alguém efetivamente analisou e planejou o engajamento de stakeholders neste tipo de projeto, conseguiu o que queria: só que às avessas. Os consumidores, que considero como stakeholders primários neste caso, realmente estão cada vez mais engajados, só que em reclamar e perder o principal elemento o qual nenhuma campanha promocional pode passar sem: a confiança. Essa não voltará tão fácil.

(PS. Enquanto escrevo esta coluna, entro de novo no site Reclame Aqui para averiguar e reforçar algumas de minhas colocações. Faz quase meia hora que o site não carrega, ou carrega com dificuldade. Deve estar sofrendo com o excesso de acessos… Enquanto isso, encontrei uma notícia fresquinha cuja chamada explica muita coisa: “Lojas já batem recorde diário de queixas durante a ‘Black Friday’, diz Reclame Aqui “, e o dia ainda nem acabou  – veja em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/11/1378370-lojas-ja-batem-recorde-de-queixas-durante-a-black-friday.shtml . A relevância é tamanha que o  site reclame Aqui até publicou um blog com as últimas notícias, ao vivo, só dos resultados das reclamações: http://blog.reclameaqui.com.br/).