Uma das grandes questões sobre o trabalho para várias pessoas é: precisamos ser ágeis (estamos nos referindo à filosofia ágil e não apenas ser rápido)? Se a resposta for “sim”, quais são as vantagens da agilidade?
Introdução
A agilidade não está apenas em fazer algo rápido. Se isso fosse sua vantagem absoluta, bastava apenas criar um processo contínuo que, ao repeti-lo, não causaria exaustão. Assim, as pessoas o fariam de olhos fechados e aumentariam muito a sua produtividade, não por fazer mais rápido, mas por errar menos e otimizar ao máximo o processo produtivo.
Entretanto, o mundo muda e as necessidades dos consumidores também. Consequentemente, a forma como alguma coisa é feita também pode se alterar. Portanto, para as empresas que estão “sofrendo” com o surgimento de inovações, é necessária uma adaptação contínua.
Uma reflexão com a palavra “sofrer”: a inovação não deveria ser uma angústia, mas uma cultura criada para empresas que estão expostas às mudanças no mercado. Logo, precisamos falar sobre outro elemento que, juntamente com a velocidade, compõe a agilidade: a adaptabilidade.
Além disso, para uma empresa atuar com a filosofia ágil, é preciso haver um terceiro componente: garantir que os times sejam autogerenciáveis. Toda empresa precisa de líderes – lembrando que a liderança vai muito além do cargo –, e muitos deles são responsáveis por transformar os negócios e a realidade do mercado.
Qual é a importância de ter um líder?
Os líderes são as pessoas que de fato transformam o mercado. Eles são visionários, pensam à frente e enxergam o que ninguém mais consegue. É importante também que sejam criativos, persistentes, empáticos e voluntariosos. Eles trazem grandes mudanças para o mercado, provocando em muitos casos sua ruptura e transformando seus produtos e serviços.
Porém, quantos desses líderes surgem em cada geração? A resposta é simples: poucos. Muitos dos líderes que trabalham no nosso dia a dia não possuem esse potencial criativo. Por outro lado, eles podem promover a independência dos times e torná-los mais ágeis. Pode parecer confuso, mas o que estamos falando é que os líderes ágeis trabalham para que eles não sejam essenciais.
Ou seja, para que os times possam atuar muito bem sem a presença deles e que eles sejam autogerenciáveis. A velocidade está associada ao terceiro princípio do Manifesto Ágil. A adaptabilidade, ao segundo, e as equipes autogerenciáveis, ao décimo primeiro. Portanto, a dica é: se você é um líder e quer implantar a filosofia ágil, promova a auto-organização.
Ela é responsável por promover equipes estáveis, nas quais as pessoas se conhecem, existe confiança mútua e não é necessário promover continuamente a melhoria nos relacionamentos para evitar conflitos. Tudo é ajustado de forma rápida e intuitiva.
Se analisarmos o conceito de velocidade, veremos um paralelo entre os times autogerenciáveis e a repetição de processos. Quanto mais as pessoas se conhecem, mais elas compreendem umas às outras, reduzindo as barreiras entre elas e evitando o desperdício de tempo ao agirem politicamente por não se conhecerem.
Além disso, ter interfaces conhecidas entre os indivíduos cria um sistema adaptativo complexo que facilita a mudança à medida que o trabalho cresce e evolui. Eles vão se adaptando e compreendendo como extrair o que há de melhor em cada um dos integrantes da equipe.
Por que as startups podem alcançar mais rapidamente bons resultados?
Por que as startups são mais frequentemente candidatas a unicórnios, ou seja, a alcançar um bilhão de dólares em valor de mercado em velocidades muito mais rápidas do que empresas centenárias e tradicionais?
As startups são pequenas, possuem recursos escassos e vêem uma necessidade de se adaptar rapidamente. Não cabe a elas vaidade, ego ou qualquer outro tipo de sentimento ou atitude individualista. Elas permanecerão vivas se utilizarem a filosofia ágil, ou seja, com adaptação, rapidez e autogerenciamento.
Cada pessoa deve dar o seu melhor e ir além da sua função. Para isso, elas precisam ter liberdade e fazer o que acreditam ser o certo. Pois, do contrário, se houver uma estrutura hierárquica, a sua velocidade cairá e ela desaparecerá do mercado.
Em uma startup, o dinheiro é importante, mas a entrega com qualidade é mais essencial para continuar recebendo novos investimentos e ganhar credibilidade no mercado. A satisfação do cliente é fundamental e entregar valor a ele é o mantra das startups – a propósito, esse é o primeiro princípio do Manifesto Ágil.
Os processos adaptáveis
Um exemplo conhecido de uma empresa que vive uma busca constante pela agilidade é a Autodesk, importante empresa de softwares de design de desenho assistido que já dominou cerca de 85% do mercado. A firma deseja avançar em direção aos processos adaptáveis por dois motivos.
O primeiro envolve tornar a empresa um lugar em que as pessoas desejem trabalhar, como o Google ou a Apple. Lembre-se que times autogerenciáveis funcionam cada vez melhor quanto mais os envolvidos se conhecem. Turnover alto promove a perda desse conhecimento e relacionamento. As boas relações são uma das chaves para o bem-estar e satisfação das pessoas e trazem vantagens concretas e fisiológicas para todos.
Quando estamos ao lado de quem gostamos e/ou admiramos, o hipotálamo – situado na base do nosso cérebro – produz e libera um hormônio chamado ocitocina. Ele exerce importantes funções no nosso organismo e nas sensações de prazer, influencia nosso comportamento, fortalece a memória, o reconhecimento, o apego, a generosidade, a empatia e outros comportamentos ligados à interação social.
Portanto, relacionar-se bem faz as equipes se tornarem mais felizes, produtivas e seguras. Voltando à Autodesk, um líder ágil disse há alguns anos: “nossa ameaça existencial não é um concorrente direto, são quatro caras em uma garagem que não querem vender o negócio deles para nós”. Eles pretendiam fazer da firma um lugar legal para trabalhar, produzir e criar.
O segundo motivo é que a empresa está mudando o seu modelo de negócios. Ela dependia de vendas de licenças que eram caras para os clientes, mas eram o modelo padrão das firmas de software. Em 2014, quando a Autodesk começou a acelerar a adoção do Scrum, informou ao mercado que mudaria seu padrão de negócio de vendas de licença para vendas de assinatura.
Mas qual era um dos principais objetivos da empresa? A ideia era criar um relacionamento mais frequente com os clientes, além de atingir diversos novos mercados que não eram atingidos pela restrição orçamentária de comprar uma licença. Eles começaram a vender assinaturas e também a perder dinheiro, e não foi pouco.
Porém, eles não desistiram do seu objetivo e, em 2016, os investidores perceberam que a ideia era disruptiva. Em 2018 o valor das ações aumentaram 121% em relação ao ano de 2016, e o índice do preço/lucro passou de 3,50 dólares em 2013 para mais de 13 dólares em 2018. A empresa, hoje, busca facilitar as entregas aos clientes e criar um ciclo de feedback mais curto entre o usuário final e a organização, reduzindo os custos e aumentando a satisfação dos clientes.
Conclusão
O Scrum, mais famoso framework ágil, mudou a Autodesk. Porém, ela o adaptou para o que necessitava. Não existe uma maneira única de fazer coisas que sirvam para todos. Em vez disso, o líder ágil precisa ajudar a sua organização a se adaptar e se reinventar à medida que avança – por isso o Scrum não é uma metodologia, mas um framework.
O líder ágil precisa conhecer mais a filosofia ágil do que o próprio framework que utiliza. Ele deve definir as condições iniciais e como o implementar, depois inspecionar e se adaptar de acordo com a familiaridade com a filosofia e com o framework. Assim, tanto as organizações quanto os produtos passam a evoluir cada vez mais rapidamente.
O que podemos concluir é que a filosofia ágil, quando utilizada em sua essência, tem um poder transformador nas pessoas e empresas. Não adianta ter um certificado em Scrum e saber de cor cada etapa, se não se compreende o propósito de ser ágil, e não apenas veloz.
Referência Bibliográfica
SUTHERLAND, J.J. SCRUM: guia prático: Maior produtividade. Melhores resultados. Aplicação imediata. 1˚ Ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2020.
SUTHERLAND, Jeff. Scrum. A Arte de Fazer o Dobro do Trabalho na Metade do Tempo. 2˚ Ed. Alfragide: LeYa, 2016.
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