Na incessante busca por inovar e cuidar das pessoas, iniciamos uma jornada de novos projetos. Para entregá-los com qualidade e velocidade, decidimos usar a filosofia ágil. Encontramos muitos desafios, principalmente na mudança do mindset.
Este artigo foi escrito por Fernando Arbache e Luiz Artur Costa Correa.
Introdução
Ao longo da história, diversas doenças nos mostraram uma ambivalência humana: somos, ao mesmo tempo, frágeis e antifrágeis – conceito desenvolvido por Nassim Taleb e bem explicado em sua magnum opus “Antifrágil – Coisas que se beneficiam com o caos”. Enquanto indivíduos, somos frágeis e estamos sob o risco constante de doenças ou pandemias, como a Covid-19 explícita.
Por outro lado, enquanto espécie, temos uma impressionante capacidade de crescer e inovar para nos proteger coletivamente em momentos como a pandemia que vivemos. Com o desenvolvimento de tecnologias mais avançadas, somos cada vez mais capazes de aproveitar o caos e buscar soluções rápidas e inovadoras, aprendendo e crescendo com os problemas.
Estamos presenciando uma corrida pela vida, iniciada com surgimento de uma pandemia absolutamente inesperada – ainda que os cientistas nos advertissem para o fato de que, em algum momento, a humanidade enfrentaria algo assim.
Ainda que com baixa letalidade, o vírus de alta transmissibilidade se espalhou, aproveitando a grande rede global de logística e integração entre nações e continentes, que desenvolvemos ao longo dos últimos séculos para nos aproximar de outras sociedades e fazer negócios. Por meio dessa rede que possibilita o crescimento econômico e leva o progresso a todas as nações abertas a ela, o vírus saiu de um mercado chinês para o mundo.
Agora sabemos, mais do que nunca, que a disseminação de doenças contagiosas é potencializada pela nossa capacidade de nos movimentar rapidamente pelo mundo. Quanto mais investirmos em reduzir as fronteiras, maiores as chances de epidemias e surtos locais se transformarem em pandemias. Nosso progresso econômico e tecnológico a nível global aumentou nossa fragilidade e permitiu que a Covid-19 se espalhasse por mais de 200 países em poucos meses.
Isso trouxe impactos tão profundos que, o FMI (Fundo Monetário Internacional), já em abril de 2020, anunciava uma possível depressão econômica pior que a de 1929.
Agilidade na resolução de problemas complexos
Ao nos deparamos com esta nova condição, na qual problemas locais são escalados rapidamente para globais, percebemos a importância de reagir com rapidez e efetividade a cada nova ameaça tão logo que ela surja. Quanto mais rápido reagirmos, menor será o impacto causado pelo problema. A reação não pode ser um ato reflexo, impensado. A reação deve ser guiada pelos princípios de observação, priorização, ação e mensuração.
Para isso, devemos ser capazes de solucionar problemas complexos, abordando a complexidade a partir do framework Cynefin, de Dave Snowden. Eventos como os causados pela COVID são incertos por serem novos. Como não há parâmetros, não podemos fazer comparações ou buscar soluções prévias.
A resolução desse tipo de problema começa com uma ou mais hipóteses, que devem ser testadas e comprovadas com muita agilidade, para que a resposta à doença seja rápida. Por ser algo nunca testado anteriormente, a solução passa pela experimentação empírica, observando-se as causas e efeitos e analisando-se evidências suficientes, para obterem-se resultados eficazes.
Para que os problemas sejam resolvidos, faz-se necessário que os diversos setores envolvidos engajem-se em uma colaboração global, agindo de forma diferente para inovar em um ritmo sem precedentes. Indústrias farmacêuticas, cadeias de suprimentos e sistemas de saúde estão adotando formas ágeis de trabalhar, em uma corrida para entregar vacinas em centenas de países. A ideia é criar ecossistemas globais da fabricação, passando pela distribuição e até chegar aos braços das populações. Alfred Burla, CEO da Pfizer, que trabalha com cultura ágil, fez a seguinte afirmação:
“A cultura precisava estimular a inovação, a criatividade e a equidade como valores centrais. Foi isso que preparou a empresa para o Covid-19. Quando chegou a ocasião, já tínhamos incorporado uma cultura para sermos capazes de realizar o que conquistamos.”
A velocidade de resposta rápida da Pfizer e de outras indústrias farmacêuticas foi possível devido à adoção de filosofia ágil, com a qual os pesquisadores se dividiram em pequenas equipes com diferentes funções. Isso lhes permitiu acelerar os diversos experimentos e manter uma comunicação eficaz com os stakeholders, que, neste caso, eram os órgãos reguladores.
A implantação da cultura ágil no setor da saúde
A fala de Alfred Burla explicita que a capacidade de responder de forma inovadora e rápida aos movimentos e mudanças do mercado está associada à cultura. Portanto, para que possamos tornar uma organização ágil, será necessário que a empresa absorva essa filosofia como cultura.
Considerando a necessidade de reagir com rapidez ao mercado com soluções inovadoras para a saúde, a empresa na qual trabalhamos decidiu adotar a filosofia ágil nos projetos assistenciais. Buscamos entregar valor e soluções inovadoras aos pacientes com maior velocidade.
Ao anunciar que os novos projetos adotariam a filosofia ágil, todos os envolvidos abraçaram a ideia e iniciamos os projetos, aplicando o framework Scrum. Apesar do apoio dos diretores, C-levels da organização e demais envolvidos no processo, a implementação da filosofia mostra-se uma tarefa árdua e exige grande esforço para o alcance dos resultados.
Isso se deveu à mudança de cultura e o grande esforço de gestão da mudança da companhia. Apesar do apoio de todos, mudar a forma de pensar e trabalhar de colaboradores, diretores e C-levels não é tarefa simples. É uma missão que requer não apenas o conhecimento da filosofia e dos frameworks adotados, mas também uma mudança de mindset de todos esses stakeholders.
Existe um desafio duplo em fazer algo tão inovador em um campo onde a filosofia foi pouco ou nunca empregada. O primeiro grande desafio é levar a cultura e o framework para pessoas do setor da saúde que nunca trabalharam dessa maneira, orientando-os e educando-os. O segundo desafio é mudar o olhar de quem está acostumado a aplicar a filosofia em algo que permite errar e ter tempo para avaliar. A medicina e as patologias são às vezes tão específicas e diferentes que necessitam estudos longos, baixa taxa de erro e soluções inovadoras, exigindo do time uma resiliência maior.
Conclusão
O mundo vem mudando e, como apresentado, a evolução da humanidade, acelerada pelas constantes e incríveis inovações, trazem benefícios, mas também riscos, criando sistemas altamente complexos que se tornam frágeis a eventos extremos – os cisnes negros.
De tempos em tempos, a humanidade sofre com eventos que exigem uma adaptação para tornar a nossa sobrevivência possível. Grandes guerras proporcionaram o avanço da tecnologia e mudaram o mundo. Neste momento, vivemos um grande evento na área da saúde que vai permitir à humanidade dar um grande salto e criar novas respostas para avançar no terreno da gestão da saúde e inovação médica.
Quanto mais evoluímos, mais oportunidades criamos. Por outro lado, surgem também ameaças que nãos conseguimos antecipar. Para combatê-las e sobrevivermos a elas, precisamos mergulhar na cultura ágil e reagir com velocidade, exercendo nossa antifragilidade assim que nos depararmos com o imponderável.
Este artigo foi escrito por Fernando Arbache, CIO e sócio-fundador da Arbache Innovations, em colaboração com:
Luiz Artur Costa Correa – Mestre em Ciências da Saúde e doutor em Oncologia (atua hoje como Product Manager no Grupo DASA e tem ampla experiência em implementação de projetos na área médica).
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