Empreendedorismo e Inovação Mercado

Por Que Conhecimento?

“Development entails learning how to learn” (J. Stiglitz, 1987)

Após décadas de crescimento elevado, o Brasil cresceu menos de 1,2% ao ano em termos per capita entre 1980 e 2013. Ao que parece, caímos na “armadilha da renda média”, fato estilizado da literatura econômica caracterizado pela desaceleração da taxa de crescimento quando o país se aproxima de estágio intermediário de renda. A armadilha estaria associada às dificuldades de se passar de um modelo de crescimento baseado na acumulação de estoque de capital e de trabalho para um modelo em que conhecimento e produtividade ganham maior protagonismo.

Mas particularidades tornam o nosso crescimento especialmente dependente do aumento do conhecimento e da produtividade. Isto porque, primeiro, o país enfrenta uma das mais rápidas transformações demográficas jamais registradas. A população em idade para trabalhar continua aumentando, mas a taxas cada vez menores. E para agravar, a maior parte da população em idade para trabalhar já está engajada no mercado de trabalho. Como consequência, já estamos nos aproximando do limite de uso da força de trabalho.

Arbitragem de custos de produção influi cada vez menos na localização dos investimentos em nível global

Segundo, a nossa taxa de investimento, de 17%, é modesta para promover crescimento mais elevado e é improvável que ela venha a aumentar significativamente no futuro previsível; para efeito de comparação, a taxa de investimento dos países emergentes é 27%.

E, terceiro, diferentemente de Coreia, China e outros países que iniciaram mais cedo suas reformas em favor do comércio e do investimento, já não se pode lançar mão de várias políticas e instrumentos de promoção do crescimento por colidirem com a nova governança econômica internacional. Além disso, as novas tecnologias de produção e a rápida mudança no padrão de consumo indicam que escala e custos estão deixando de ser os principais determinantes da competitividade e dos investimentos. A localização dos investimentos em nível global está sendo definida, isto sim, mais por produtividade sistêmica e características específicas dos mercados, e cada vez menos por arbitragem de custos de produção, como salários e incentivos fiscais.

É neste contexto que conhecimento e produtividade, que foram deixados em segundo plano por décadas, terão que ser alçados a componentes centrais da nossa estratégia de crescimento econômico. Afinal, como não podemos contar, ao menos no curto e médio prazos, com elevação significativa da força de trabalho e da taxa de investimento, então teremos que usar melhor e de forma mais eficiente os trabalhadores e o estoque de capital que temos. De outra forma, teremos que produzir bens e serviços de mais alto valor adicionado e elevar a produtividade total dos fatores.

Embora tenhamos feito progresso em conhecimento, a densidade industrial e a produtividade avançaram muito lentamente nas últimas décadas. Ou seja, não conseguimos traduzir aquele progresso em agregação de valor e em competitividade.

Para voltarmos a crescer, teremos que avançar mais rapidamente e de forma mais pragmática nas agendas do conhecimento, incluindo ciência, tecnologia e educação. De fato, indicadores de produção e de absorção de conhecimento científico e rankings globais de inovação mostram situação tímida do país e distanciamento entre a academia e os mercados.

Mas ainda mais preocupante é a agenda da educação, elemento fundamental para determinar a competitividade e a prosperidade, a eficiência produtiva e a capacidade de desenvolvimento tecnológico e de agregação de valor. Nossa educação não apenas deixa a desejar, mas, ainda mais importante, a sua qualidade é muito desigual entre regiões, classes sociais e entre as redes pública e privada de ensino.

O problema da elevada heterogeneidade da educação é que ela não é neutra do ponto de vista coletivo, o que decorre da crescente interdependência produtiva associada às novas tecnologias de produção e de organização da produção. O desempenho de um trabalhador depende, por isto, do seu conhecimento e experiência, mas, também, do ecossistema em que ele está inserido. Não por acaso, as cadeias de valor e a terceirização da produção se tornaram canais de transmissão de benefícios, mas, também, de fragilidades da fragmentação do trabalho.

Como avançar? É preciso reconhecer que o nosso modelo educacional se tornou obsoleto para a era do conhecimento, pois continua ancorado em métodos de aprendizado conteudistas, de conhecimento segmentado e que privilegia a repetição. Ao invés de ensinar a pensar e desenvolver habilidades relevantes para a vida pessoal e profissional, as escolas levam os alunos a digerir grandes quantidades de informações em aulas expositivas sobre assuntos muitas vezes de pouco interesse e utilidade. Como a atividade laboral envolverá atividades cada vez mais colaborativas e organizadas por tarefas, teremos que prover os alunos dos conhecimentos necessários para que possam interagir com as novas tecnologias e que os capacitem a participar ativamente do mundo e do mercado de trabalho que os aguardam.

Também teremos que desenvolver políticas que reduzam as enormes disparidades de capital humano entre pessoas e entre empresas, o que requer definir metas mínimas de conhecimento para os estudantes e para as escolas; distribuir os recursos financeiros e humanos de forma que as escolas e estudantes com pior desempenho tenham mais e melhores recursos; estabelecer currículo em nível nacional, incluindo a definição de material didático básico; criar forças-tarefas para apoiar Estados e municípios a alcançarem as metas; desenvolver políticas de educação profissional de forma que as empresas com maiores deficiências de acesso a capital humano recebam mais atenção; e desenvolver programas de educação profissional adequados à realidade daquelas empresas.

Por fim, teremos que investir mais em ciência e em tecnologia, encorajar o maior engajamento do setor privado nesta agenda e fomentar a disseminação e o acesso ao conhecimento e às novas tecnologias para empresas de todos os portes e setores.

Jorge Arbache é professor de economia da UnB. jarbache@gmail.com.

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